Doce fantasma, por que me visitas
como em outros tempos nossos corpos se visitavam?
Tua transparência roça-me a pele, convida
a refazermos carícias impraticáveis: ninguém nunca
um beijo recebeu de rosto consumido.
Mas insistes, doçura. Ouço-te a voz,
mesma voz, mesmo timbre,
mesmas leves sílabas,
e aquele mesmo longo arquejo
em que te esvaías de prazer,
e nosso final descanso de camurça.
Então, convicto,
ouço teu nome, única parte de ti que não se dissolve
e continua existindo, puro som.
Aperto... o quê? a massa de ar em que te converteste
e beijo, beijo intensamente o nada.
Amado ser destruído, por que voltas
e és tão real assim tão ilusório?
Já nem distingo mais se és sombra
ou sombra sempre foste, e nossa história
invenção de livro soletrado
sob pestanas sonolentas.
Terei um dia conhecido
teu vero corpo como hoje o sei
de enlaçar o vapor como se enlaça
uma idéia platônica no espaço?
O desejo perdura em ti que já não és,
querida ausente, a perseguir-me, suave?
Nunca pensei que os mortos
o mesmo ardor tivessem de outros dias
e no-lo transmitissem com chupadas
de fogo aceso e gelo matizados.
Tua visita ardente me consola.
Tua visita ardente me desola.
Tua visita, apenas uma esmola.
Carlos Drummond de Andrade
terça-feira, 29 de dezembro de 2009
sábado, 26 de dezembro de 2009
Carpinejar
Temos o costume de considerar bonita a letra que se entende. Mas a personalidade está no garrancho - Carpinejar -
DESCONHEÇO A AUTORIA DA IMAGEM
sexta-feira, 4 de dezembro de 2009
Tarde de sexta-feira qualquer
Uma tarde que poderia ser como qualquer outra, mas tem no timbre quase um poema, um som leve que me faz viajar nas paredes do meu sonho.
Sinto uma paz como há muito não sentia, algo como uma mistura de asas volitando na barriga e plumas acariciando meu instinto.
Sinto-me menos humana, quase fada, parece que agora tudo que quero, posso ter...
Olho pra janela e vejo um céu acinzentado, brando, parece que o mundo parou de respirar, ou está naquele estágio de sono profundo, prudente.
Olho pras minhas mãos e as vejo perfeitamente ‘feitas’ pintadas como gosto, com o capricho cintilante que só minha manicure consegue.
Nesse instante tomando um gole de chá, escrevo para mim mesma, pra me ouvir...
Sinto um total desprendimento de espírito como se pudesse nesse minuto de tempo, flutuar e dançar rodopiando feita bailarina em seu solo, quase cisne, quase tão bela quanto esse tímido sol que estou a ver agora nesse finzinho dessa sexta-feira ‘qualquer’.
texto & imagem by Solange Mazzeto
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